quarta-feira, 8 de junho de 2016

sobre A MONTANHA MÁGICA - de Thomas Mann / P1






sobre A Montanha Mágica [Der Zauberberg] 1924
do escritor alemão Thomas Mann [1875-1955]


Um duelo de ideias e ideologias nas alturas

parte 1


     Os eventos da narrativa acontecem em fins do século 19 e aurora do século 20, em plena Belle Époque, assim como as memórias de Em Busca do Tempo Perdido, de Marcel Proust, e Ulisses, de James Joyce, quando a Europa ainda debatia em retórica as ideologias que passaria a defender nos campos de batalha. Ainda os arautos do Iluminismo, da economia liberal burguesa, contra os dogmáticos do controle, da repressão, da moralidade religiosa.

     Encontramos o jovem Hans Castorp numa viagem de trem até as alturas do Alpes suíços, a sofrer com a melancolia das mudanças de rotina, assim como sofria o jovem Marcel, nas viagens com a avó, no Em Busca, rumo a estação gélida de uma pequena aldeia, onde deve se encontrar com seu primo Joachim Ziemssen, para rumarem junto para o Sanatório Berghof, naquelas paisagens desoladas das altas altitudes. Enquanto trocam saudações e cordialidades, o primo Castorp percebe o visível restabelecimento físico do primo Ziemssen, que se dedica à carreira militar.

     Acompanhamos a recepção na portaria do sanatório, onde o quarto 34 é reservado para Castorp, que se inquieta com o ambiente hospitalar, asséptico, onde até uma tosse prolongada e profunda pode ser uma perturbação. Logo, o recém-chegado perceberá a singularidade do local e do tempo neste ambiente de repouso e de recuperação. Um local isolado, no clima gélido, no alto da montanha, onde a vida passa com certa lentidão, como diz o primo Joachim, "Três semanas são como um dia para eles." [Drei Wochen sind wie ein Tag vor Ihnen.]

     No restaurante, durante o jantar, entre os primos as pitadas de humor e de desassossego, com um breve desabafo de Ziemsssen, que não fosse devido ao diagnóstico de tuberculose não estaria ali, tão jovem, entre aposentados e agonizantes. "Em geral, [o tempo] não passa, não há tempo, e não há vida, realmente não há". Logo, Castorp é apresentado ao Dr. Krokowski, autoridade local. A primeira pergunta do doutor é sobre a condição do jovem, se visitante ou paciente. Será Castorp um doente? Afinal, o doutor não crê numa saúde plena. Depois, um merecido repouso, seguem-se sonhos num quarto de sanatório.

     No capítulo seguinte, há um flashback com imagens da vida de Castorp na planície, na cidade portuária de Hamburgo, na região norte da Alemanha. Após a perda da mãe e do pai, Hans encontrava-se sob os cuidados de seu avô paterno Hans Lorenz Castorp, cidadão pleno de seriedade e tradicionalismo, um senador, uma figura pública. Hans lembra-se do velório do avô, e a meditar, diante da morte, um vencedor ou um vencido? Os dois aspectos da morte, a solenidade ostentada e a decomposição ocultada. Hans lembra-se da morte do pai, ao ver o avô morto.

     Depois de mais uma morte na família, Hans, o jovem, vai para a casa dos Tienappel, parentes da mãe. Sabemos mais sobre a juventude de Hans, seu ambiente, suas dúvidas e hesitações, sua mediocridade. Não que o Narrador o despreze, a saber que o protagonista não é gênio nem idiota, mas vive como todos vivem na vida mediana, sem novidades ou aventuras. Ou seja, Hans é um jovem sem excentricidades, mas com certa curiosidade, e alguma capacidade de ouvir. O que ele não sabe, ele certamente pode aprender. Seu destino não é somente individual, pois o transcende, ele enquanto representante daquela juventude que se perdeu na Primeira Guerra Mundial (como já percebemos na vida e morte do nobre e militar Robert de Saint-Loup no Em Busca).

     Hans, o moço de família tradicional, seguiria as tendências conservadoras do avô? Ou seria mais um democrata? Ou se inclinaria para os radicalismos - de esquerda ou de direita? Ou seria audacioso igual aos americanos, empreendedores em negócios e lucros? Hans decidira-se pela Engenharia naval, mas os estudos acabam por esgotá-lo. Seu médico, o Dr. Heidekind, vem aconselhá-lo a passar um tempo, em descanso, nas montanhas. Por isso Hans vai visitar o primo Ziemssen. É um outro ambiente, aquele das alturas. Após sonhso perturbadores, o despertar. Suas primeiras observações no mundo do sanatório. Lá uma mulher de aspecto sombrio, e um casal de russos, um tanto indiscreto. A irritação de Hans com a luxúria dos russos, num local de repouso e agonia.

     No café da manhã, Hans Castorp tem mais informações sobre a mulher de aspecto sombrio, além do que o primo o apresenta aos outros internados. Os companheiros de mesa na sala do refeitório, que será o cenário de episódios cômicos e sinistros. Hans é apresentado ao Dr. Behrens, outra autoridade médica local. Quando o Dr. Behrens diz a Hans que o jovem não está saudável, mas anêmico, Hans diz ao primo, "Vou aceitar e fazer como ele disse, e adotar o teu estilo de vida, - o que mais eu deveria fazer aqui em cima junto a vocês..." (p.70) Mas não de todo, pois Hans tem grande prazer ao fumar - um hábito que deverá abandonar caso tenha insuficiẽncias respiratórias... Enquanto, o jovem compartilha impressões sobre o Dr. Behrens, há uma brincadeira de mau gosto por parte da 'turma' do pneumotórax, que provoca hilaridade com um ruído deveras inconveniente. Hans prefere uma postura solene diante da morte, e no trato com os mortos.

     Há alguns deslizes de comunicação entre os primos, por diferença de ambiente. Uma dificuldade de compreensão, de transmitir uma percepção de realidade. Hans não presta muita atenção quando seu primo lohe aponta, e nomeia, os cumes alpinos, em Davos-Dorf. O jovem não compreende, não vivencia a realidade do outro, não compartilha sua perspectiva. Ele sente-se o visitante, o forasteiro, o estrangeiro, deslocado na pátria do outro, um ser da planície no ar rarefeito das montanhas.

     Então, aparece a figura do professor italiano Signore Lodovico Settembrini. É ousado, gracioso, não exatamente elegante, mas algo de nobre, numa mescla de desalinho e graça, e Hans pensa logo nos músicos tocadores de realejo. Há muita ironia e malícia no Sr. Settembrini, mas ele é inofensivo, trata-se de um pedagogo. Ele é moderno e clássico, a elogiar o progresso e o poeta Virgílio, a se empolgar com as presenças femininas. Sua jovial mordacidade tem algo de socrática, de provocar para fazer pensar, mesmo quando em ataques retóricos ao ambiente do sanatório e os 'bons' médicos, que lucram com a doença alheia.

     Settembrini relaciona a malícia com um certo 'espírito crítico' necessário ao pensador rumo ao esclarecimento. Aqui no sentido de Iluminismo mesmo (Aufklärung, Enlightment) como um combate contra as trevas da ignorância. É que Settembrini pretende ter um novo ouvinte-aluno: o próprio Hans. "Pois não se deve tirar os humanistas de sua função educadora." [Man soll dem Humanisten das Amt der Erziehung nicht nehmen. p. 94] No mais, o literato elogia a escolha do engenheiro, pois a técnica é necessária e difícil. Hans se deixa seduzir pela retótica sardônica do italiano. O jovem visitante evita julgar as pessoas, mas para o professor trata-se apenas de apatia, pois deve-se julgar.


     Enquanto as 'aulas' com Settembrini não se iniciam, Hans é deixado em sua solidão na montanha, onde a passagem do tempo é deveras diversa da planície, onde mil afazeres impedem a contemplação e o pensamento. O tempo parece passar de acordo com nossa percepção, parece demorar, quando julgamos demorar, e passa rapidamente quando percebemos que é curto. O que é o tempo? Was ist denn die Zeit? Como pode ser o tempo mensurável se não passa de forma uniforme? Para a consciência humana o tempo é relativo. Nossas medições não passam de meras convenções... Quando sofremos, o tempo demora passar, e quando nos divertimos, ele é célere. A dor dura, o prazer é efêmero.

O tempo absolutamente não tem qualidade própria. Quando nos parece longo, é longo, e quando nos parece curto, é curto, mas ninguém sabe o quanto é longo ou curto em sua realidade. [Die Zeit ist doch überhaupt nicht 'eigentlich'. Ween sie einem lang vorkommt, so isto die lang, und wenn sie einem kurz vorkommt, so ist sie kurz, aber wie lang oder kurz sie in Wirklichkeit ist, das weiss doch niemand." p. 96.]

Em seu novo mundo na 'montanha mágica', Hans logo se adapta aos momentos de repouso, de refeição e de passeio. Em passeio pelo centro comercial, ele em considerações sobre o corpo e alma, sobre o ambiente e a percepção. De volta ao refeitório, ele descobre quem é a pessoa responsável pela porta que se fecha com estrondo, uma jovem russa, a Madama Chauchat. Ela o irrita, mas ao mesmo tempo o fascina. É como se ele a conhece de algum lugar... Enquanto se entregas às suas meditações, o jovem descobre preocupações hipocondríacas, a imaginar-se realmente com alguma doença.

     Hans até pensa em ir-se logo embora, mas vai-se envolvendo com o ambiente do sanatório, com os companheiros de mesa, que sempre organizam alegres reuniões para depois do jantar. Diante do cansaço e da melancolia, de Hans, até o prof. Settembrini sugere que o jovem vá logo embora, para sua vida na planície, onde as percepções são outras. Mas Castorp demonstra sua coragem, mesmo a conviver agora com cochilos tensos, noites de insônia, incômodos com vizinhos de quarto, sonhos agitados, que o deixam cabisbaixo, sem confiar nos próprios sentidos.



     Terceiro dia no sanatório. Há uma mudança climática, mesmo sendo pleno verão, quando se precipita uma nevasca. Parece que não há propriamente estações ali nas alturas. é preciso comprar mais cobertores, e os primos descem até a aldeia. Na volta, eles encontram o Sr. Settembrini, a lamentar o frio repentino e os princípios de disciplina e regime. O professor italiano relembra o pai, um erudito de Pádua, que amava o calor, o clima tépido de seu gabinete. No mais, Settembrini mostra-se aborrecido com sua estada ali, cativo de seu tratamento. Hans concorda que é um dilema estar cercado pela doença e pela ignorância, quando a doença ainda é digna de reverência, mas a ignorância não se sabe se é para rir ou para chorar.

     Já o professor Settembrini não percebe a doença como algo nobre, digno de reverência, mas, ao contrário, uma debilidade que traz a indignidade, sendo para a condição humana uma humilhação. E o humanista italiano se lembra dos grandes artistas acometidos por doenças, e que são obrigados a criar em condições de enfermidade, quando a alma está rebaixada pelo estado doentio do corpo. Mas é de se pensar se as debilidades não são um incentivo para a superação do artista. Se o poeta não fosse um doentio, um tuberculoso, em repouso e solidão, teria ainda assim criado a obra? Se fosse um jovem robusto e sensual, dado aos prazeres, teria tempo para meditar e criar tudo o que escreveu? Mas para Settembrini qualquer exaltação da doença é coisa de seres mórbidos.


     À tarde, com os novos cobertores, Hans abandona-se ao repouso. O narrador segue em considerações sobre o hábito e o fluir do tempo; a monotonia da rotina parece retardar o tempo e situações novas e interessantes parecem acelerá-lo. Mas, na memória, o processo é outro: os períodos de monotonia, não marcados, destacados, não constituem lembranças, e assim abreviados. Já os períodos de interesse, que deixam lemranças, conferem amplitude e densidade ao curso do tempo. "Os anos plenos de acontecimentos passam mais devagar do que aqueles outros, pobres, vazios, leves, que são soprados pelo vento e se vão voando." ["ereignisreiche Jahre viel langsamer vergehen als jene arme, leeren, leichten, die der Wind vor sich her bläst, und die verfliegen." pp. 145-146] A rotina traz a monotonia, que traz o tédio. E assim tempos se passam sem que percebamos.


"O assim chamado Tédio é uma brevidade doentia do tempo por causa da monotonia: os grandes lapsos de tempo se contraem em inquebrável homogeneidade, que causam ao coração um susto mortal; quando um dia é igual a todos, todos são como um, passada numa uniformidade perfeita, a mais longa vida seria vivida como muito breve e passaria de súbito." ["Was man Langweile nennt, ist also eigentlich vielmehr eine krankhafte Kurzweiligkeit der Zeit infolge vor Monotonie: grosse Zeiträume schumpfen bei ununterbrocherer Gleichförmigkeit auf eine das Herz zu Tode erschreckende Weise zusammen; wenn ein Tag wie alle ist, so sind sie alle wie einer; und bei vollkommener Einförmigkeit würde das längste Leben als ganz kurz erlebt werden und unversehens verflogen sein." p. 146]

Ainda se adaptando a nova vida social no sanatório, Hans tenta uma conversa em francẽs com uma senhora mexicana, cujos os dois filhos são pacientes no hospital. Hans comenta com Joachim que prefere situações solenes e até tristes do que festas e alvoroços. Pouco solene é Settembrini, que se atrasa para o concerto de domingo, e esclarece a Castorp não seguir formalismos, sendo mais estimável sua liberdade, ou o que resta dela. No mais, o italiano não é tão fã de música, que considera até 'politicamente suspeita' [Politisch verdächtig!], uma vez que pode despertar paixões, ou entorpecer a razão. A música tem natureza ambígua. Para o humanista, a literatura deve ter proeminência.

     Hans não se permite classificar as Artes, assim como não disseca seus afetos, como aquele que dedicava a um colega de colégio, o germano-eslavo Pribislav Hippe. Ele nutria uma afeição pelo outro mesmo sem que este saiba. Algo de platônico, ou altrupista. O desprendimento sem esperar reconhecimento e recompensa - seja afetiva ou sensual. Mas por que lembrar-se do colega Hippe agora? É que Hans observa a insolente Madame Chauchat, a russa ruidosa, que muito lhe lembra o colega. É voltando ao passado que ele pode compreender os afetos do presente? Algo de psicanálise aqui - ainda mais na palestra do Dr. Krokowski - A força amorosa, ora afeição, ora paixão sensual. Numa linguagem tanto poética quanto erudita, num rigor científico e num tom vibrante de hino. Quando a paixão é reprimida por pressões morais ela ainda se manifesta, mas como sintomas. Eis uma exposição basicamente freudiana.


     Enquanto isso, Hans divagava a observar a madame russa, a indagar de onde vem seu interesse pela indiscreta figura. E o Dr. Krokowski prossegue a conclamar a favor de uma 'dissecação das almas' [die Seelenzergliederung], ou seja, a análise, com a 'iluminação do inconsciente' [die Durchleuchtung des Unbewussten], sim, eis um discípulo de Freud. O Dr. Krokowski parece se manter acima e além dos pacientes, como a 'analisá-los', mas o Dr. Behrens tem uma atitude participativa. Ele também é um doente. Assim ele tem empatia com os que sofrem, por experiência própria. Mas não deixa de ser um paradoxo um médico enfermo, conhecedor e, ao mesmo tempo, debilitado. Como terá autoridade, sendo ele mesmo um paciente?

     A vida passa no sanatório e Hans cada dia se adapta mais aos horários e aos comensais. A exasperação pelos modos pouco discretos da madame Chauchat torna-se afeição? Ele se angustia com a demora, ou ausência, dela. E Hans não é ator o suficiente para dissimular seus sentimentos. E todos percebem, não há como ter privacidade ali na montanha. O tempo passa, este grande enigma, e Hans deseja se fazer notar pela russa, com olhares e gestos. Clawdia Chauchat enfim percebe e se abstém de suas conhecidas inconveniências. Por mais que reprove muitos hábitos em Clawdia, Hans se interessa por ela, mesmo que pouco assuma para si mesmo. Ele considera tudo uma 'aventura de férias'. Ainda nem se completaram duas semanas no sanatório, no alto da 'montanha mágica', e o jovem Hans, de quase 24 primaveras, considera estar ali a muito mais tempo, a ponto de julgar a vida da planície como anormal.

     No mais, o jovem precisa de autoridade, de uma figura paterna, que a ele sempre fizera falta, passando de avô a tutor, sem se adaptar as ausências, perdas tão precocemente sentidas. Ali na montanha haviam os doutores, o médico do físico, o Dr. Behrens, e o médico da mente, o Dr. Krokowski, e aparecera o pedagogo Settembrini, animado para encontrar um discípulo. No mais, o italiano narra a história de seu avô Giuseppe, rebelde e patriota, que atuou na 'primavera dos povos', nos idos de 1830-1848, inconformado com a tirania sobre a Itália desunida. Hans contrapõe a figura do antepassado italiano a figura de seu avô Hans Lorenz Castorp, também inconformado com o tempo em que viveu, mas por homenagem ao passado, por nostalgia.

     Realmente, os dois avôs se distanciam da vida presente. O italiano era progressista, olhava para o futuro, enquanto o alemão era conservador, e idolatrava a paz social do passado - que, sabemos, não havia. Daí Hans pensar nos dois mundos, deslocados, em dois pontos cardeais. Afinal, Hans tem algo de conservador, igual ao avô, enquanto Settembrini é deveras progressista, tal o avô italiano. O pedagogo elogia o progresso técnico desde que este propicie o contato entre os povos, levando-os assim a romperem com os preconceitos e a estabelecerem acordos de convivência e cooperação. Settembrini crê no 'aperfeiçoamento moral' dos grupos humanos, das trevas da ignorância e da superstição rumo a consciência, a simpatia, e a 'união universal'. Ele elogia o princípio da 'igualdade e da união', desde Cristo até sua consolidação na Revolução Francesa, fruto dos ideais iluministas do século 18.

     Hans percebe estar a ouvir o Sr. Settembrini também por uma 'ausência de responsabilidade', devido a um 'sem compromisso', como estar em férias, distante da vida normal, da 'ordem habitual'. Ele sente-se um turista, alguém apenas de passagem. Ouve, assim, o italiano apenas como um entretenimento a mais, para adquirir 'experiência'. E segundo Settembrini haviam "dois princípios" que viviam a disputar a 'posse do mundo', um de estagnação e outro de progresso, sendo que o primeiro tem força, tirania, superstição, enquanto o segundo tem liberdade, dirieito, ciência. Enquanto progressista, Settembrini crê na vitória do progresso, da razão e da Iluminação (Aufklärung). Ele justifica a ocupação da Ásia e da África como esforços de 'homens de boa vontade' para a propagação do progresso aos povos em 'estagnação'. Percebe-se que é uma visão bem europocêntrica, que legitimou os avanços imperialistas do século 19.

     Settembrini exalta os humanistas, dispostos a 'liberdade do pensamento', devotos do progresso e da técnica, a ponto de considerar o titã Prometeu como o 'primeiro humanista'. Aquele que roubou o fogo dos deuses para entregá-lo aos humanos. Por isso, o professor desconfia de todas as forças reacionárias, da literatura, da música, do dogmatismo religioso. Settembrini declara ter se tornado um escritor livre, a combinar o civismo do avô com o humanismo do pai, a associar vida literária e pensamento político. É preciso se dedicar aos seres humanos, para melhor o nível de vida, e assumir responsabilidades, sem tutores do clero ou da tirania. Humanismo consiste em dignidade, respeito e tolerância. Hans concorda com tudo, e deixa-se ouvir. É a força da retórica.

     Mas Hans, em sua terceira semana de estadia em Davos, já antecipa seu retorno à planície, a sua vida 'normal'. No entanto, agrava-se o resfriado de Hans, que a Dra. superiora diagnostica como 'cataro das vias respiratórias'. E o status de Castorp começa a mudar com sua temperatura de 37,6 graus! É uma verdadeira agitação provocada pela novidade. O Dr. Behrens é logo informado, e Hans tem uma consulta marcada. Enquanto isso, após o almoço, Hans acompanha o exame médico em Joachim, este sempre angustiado com o físico, diferentemente do jovem engenheiro. Então é a hora de hans passar de visitante a paciente, sob o exame do médico, a confirmar as suspeitas sobre a condição 'anêmica' do rapaz, com o dramático estado fragilizado de seus pulmões.

     Para Hans é recomendado o repouso, e um tratamento que não será de um dia para o outro, mas de semanas! Diante da decepção e espanto de Hans, o Dr. Behrens aconselha -o a ter calma, pois impaciência apenas pode agravar os sintomas. De um mero turista, agora Hans passa a compartilhar a condição de enfermo, num mundo que se preparava para abandonar. Eis o ponto de mudança do romance, quando o protagonista tem sua posição alterada, de observador para paciente. Seu aprendizado não será interrompido, ao contrário, somente agora progride com atenção e participação. Em seu estado de doente, acamado, prostrado e desanimado, Hans não poderá ver a realidade ao redor com distanciamento jovial ou caprichoso, mas com compaixão e simpatia.

 
    Os primeiros quatro capítulos do romance é mero preâmbulo ao drama de dialéticas e contradições que serão apresentadas ao jovem de quase 24 anos que deverá ter opiniões próprias diante de oradores - ou pedagogos - tão extremados. Ele, até então, tivera contato com Settembrini, mas outro figurante adentrará a narrativa em breve, com outras perspectivas e ideologias.




continua ...







mai / jun 16


by Leonardo de Magalhaens





mais info em

http://www.e-biografias.net/thomas_mann/

http://www.jornalopcao.com.br/colunas/imprensa/sergio-buarque-de-holanda-entrevista-thomas-mann-e-descobre-origem-brasileira-da-mae-do-autor-de-a-montanha-magica


https://felipepimenta.com/2013/10/02/resenha-de-a-montanha-magica-de-thomas-mann/

https://espectral.wordpress.com/2011/01/12/leituras-de-2011-thomas-mann-a-montanha-magica-1924/


http://antoniocicero.blogspot.com.br/2008/04/apresentao-de-montanha-mgica-de-thomas.html

http://www.ocampones.com/?p=6346

http://www.pmannia.com/2011/04/zauberberg-woodcuts-to-thomas-manns.html




original Der Zauberberg em alemão

http://pdbooks.ca/books/deutsch/authors/thomas-mann/der-zauberberg/vorsatz.html





Referências


MANN, Thomas. A Montanha Mágica. [Der Zauberberg] Trad. Herbert Caro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006. (Coleção 40 anos, 40 livros)




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